Daniele Barros
Extrofia Vesical… pouco se fala sobre o assunto, não é mesmo?
Me chamo Daniele, tenho 30 anos, sou psicóloga clínica e EV com mitrofanoff. Meu primeiro procedimento cirúrgico ocorreu quando eu tinha 25 dias de nascida, e o último, quando eu tinha 18 anos.
Gostaria de contar um pouco da minha história de uma forma reduzida, mas com os acontecimentos mais relevantes.
Nasci com extrofia vesical e por consequência disso ao decorrer da minha vida realizei em torno de 13 procedimentos, entre eles um dos que acredito que tenha sido o mais impactante para minha mãe, pois como eu tinha apenas 3 anos (não me tenho memória, apenas as lembranças de tudo o que minha mãe me relatou) eu precisei realizar uma cirurgia que colocaria em risco a minha mobilidade dos membros inferiores, pois iriam operar o meu osso da bacia ( aquele responsável pelo nosso molejo ), bem abaixo da coluna, pois por conta da extrofia eu tive má formação no quadril, resultando em pernas voltadas para dentro, passei essa cirurgia sem sequelas, assim como as outras que fiz sempre com o mesmo profissional especializado no assunto, nos hospitais Beneficência Portuguesa e Santa Marcelina ambos em SP.
Durante meus atendimentos na infância ouvia instruções do meu médico sobre atividades que eu não poderia fazer como as outras crianças, precisaria ter mais cautela, e minha mãe sabendo a filha sapeca que tinha ficava de cabelo em pé a cada travessura que eu fazia e não sabia se me chamava atenção ou se agradecia a Deus por eu estar me divertindo como qualquer criança sem limitações.
Ao decorrer dos anos fui crescendo e entendendo que eu tinha uma diferença quando me comparava com minhas irmãs e amigas, minha mãe é uma mulher de pouca formação acadêmica e não entendia muito bem sobre o assunto para me explicar, sentia melindres por falta de informação. E eu fui procurando me adaptar mesmo com uso da sonda eu não me privei de nada, desde da adolescência que confesso ter sido a época da minha vida onde mais me incomodei com minha condição, por não me sentir à vontade com meu corpo por conta das cicatrizes na barriga e dependência da sonda, mas também foi o momento em que mais aprendi a me conhecer. Me tornei jovem adulta e comecei a pesquisar mais sobre o assunto, foi onde percebi que não tinha muito informação disponível para estudo, ficávamos somente com as informações dadas pelos poucos médicos que de fato entendiam o assunto.
Comecei a procurar outras opiniões medicas e foi onde ouvi por diversas vezes que não poderia ser mãe ou que se eu ficasse grávida seria de extremo risco para o bebê e para mim, um balde de água fria para quem sempre sonhou em gerar uma vida, mas comecei a aceitar a possibilidade de não poder gerar meus filhos, e poderia ser mãe se eu adotasse, conheci meu marido e quando contei para ele sobre essa questão da possível impossibilidade de termos um bebê gerado pela minha barriga, ele de imediato me deu a mão e me apoio sobre adoção, marcamos a data do casamento para junho/2019 e combinamos que após o retorno da lua de mel daríamos entrada na burocracia para adotarmos nosso bebê, mas como sempre os planos de Deus são bem maiores do que os nossos, ao me casar eu já estava grávida de 1 mês e meio e não sabia, descobri quando eu estava com dois meses de gestação e só soube pois meu marido insistiu para que eu fizesse o teste mesmo sabendo que eu não poderia ser mãe pois os sintomas estavam muito fortes ( enjoo, tonturas..) e eu achava que estava com uma super infecção de urina. Vencida pela insistência do meu marido, eu fui a farmácia e comprei o teste, fiz e quando o resultado saiu eu tão desacreditada quando li – grávida + 3 – logo pensei que o teste estava quebrado rs. Foi um misto de sensações, mas não convencida fui ao laboratório e fiz o exame de sangue, em uma hora o resultado saiu, e lá estava – positivo – mesmo assim insisti em achar que poderia ser algo errado, e no dia seguinte fui ao hospital e solicitei um transvaginal … “TUTU TUTU TUTU” E lá estava meu milagre, meu filho se gerando no meu ventre como sempre sonhei e pedi a Deus, o coração dele batendo no exame e o meu quase parando de tanta emoção.
Durante a minha gestação precisei ficar de repouso relativo, ou seja, eu poderia trabalhar, porém de casa, minha gravidez era de risco. Realizei um pré-natal completinho e fazia exatamente o que o medico me orientava, mesmo sendo de risco eu não me privei de sair e desfilar com meu tesouro na barriga. Enquanto estava grávida entendi que eu precisava expor sobre o que é a extrofia, o mundo precisa saber mais sobre esse assunto e eu achava que eu era uma das únicas pessoas que tinha essa deficiência, pois não conhecia mais ninguém. Foi então que conheci o NAPEX (Núcleo de apoio à pessoa com Extrofia Vesical), nossa que emoção o dia que comecei a pesquisar sobre e entendi o trabalho do NAPEX. Consegui falar com a Su que faz parte da direção do grupo e fui convidada a participar do evento anual deles em SP, e fui com toda honra e lá me emocionei a todo momento pois conheci várias pessoas com extrofias e uma história mais linda que a outra, hoje faço parte do grupo de whats dessa galera espalhada pelo Brasil inteiro, e nos ajudamos diariamente, nos ouvindo, tirando duvidas e participando mesmo que de longe um da vida do outro. E isso com certeza faz toda a diferença.
Ouvi que não poderia correr, dançar, pular, dos filhos da minha mãe eu fui a que mais aprontou pulando, correndo, e ainda dei aula de dança por muito tempo. Ouvi que não poderia fazer diversas atividades, e me tornei uma pessoa apaixonada por esportes radicais, já pulei duas vezes de paraquedas, já mergulhei de cilindro, já fiz rapel de 80 metros, rafting, já escalei montanhas, já fiz trilhas de mais de 3 horas subindo nas montanhas do Peru só para ver uma laguna lá no alto, pois é…aprendi a me conhecer e conhecer meus limites como qualquer outra pessoa.
Hoje além de psicóloga clínica, trabalho a quase 8 anos em um laboratório farmacêutico. E nada me faz menor do que os outros por ser EV.
Conquistei minha família, e sigo me cuidando, me conhecendo e agradecendo a Deus todos os dias pela mãe guerreira que me deu e por tudo o que sou.
Me coloco a disposição de pais de EVs e EVs que queiram conversar.
Beijos!
Dani Barros (mãe do meu doce Miguel)